Atento às notícias envolvendo a dança de cadeiras no governo e na Assembléia Legislativa do Ceará, vejo-me forçado a admitir que as práticas políticas vigentes nas terras de José de Alencar são das mais permissivas, promíscuas, viciadas e viciosas.
Quem ignora que a função primordial da Assembléia Legislativa é legislar e fiscalizar o Executivo¿ Quem não sabe que é papel constitucional do deputado fiscalizar o governo¿ Por que a sociedade aplaude o parlamentar que descumpre o pacto e abdica desses desideratos constitucionais, outorgados pelo povo na boa-fé ou mesmo pelas vias mais desprezíveis: da corrupção ou da compra de currais¿
Vimos que o governo do Ceará vem trabalhando para anular a função pública do deputado ao convocar alguns deles para secretarias de governo, e o faz com o fito único de acomodar os apaniguados do sistema ou aqueles que não foram eleitos pelo voto, porque o objetivo do governo, em última instância, é torná-los também nulidades em suas funções constitucionais na Assembléia Legislativa.
Anteriormente o governo do Ceará já havia capado as funções do presidente da Assembléia Legislativa, ao convocá-lo para ser seu vice. Na linha sucessória ocupou a vaga o vice-presidente do Legislativo estadual, quem, por sua vez, trai a oposição, trai seu partido, trai seus pares e também os eleitores que votaram num candidato do PSDB), e agora aceita, de forma sub-reptícia, ser pinçado também para uma secretaria de governo.
De uma tacada o governo fez da Assembléia Legislativa do Ceará um parlamento tupiniquim, subalterno e capacho do executivo, e com isso vai cooptando e anulando as funções daqueles que foram eleitos para fiscalizar, e não para se tornarem subalternos ou mesmo capachos do executivo.
Por que isso ocorre¿ Em primeiro lugar, porque o eleitor não percebe o calote eleitoral aplicado pelo deputado que abdica da outorga concedida para se tornar subalterno do governo a quem ele deveria fiscalizar; em segundo lugar, porque um governo que se presume acima do bem e do mal, acha mesmo que descarece de fiscalização dos seus atos; em terceiro lugar, porque a sociedade mais esclarecida não se importa que a função pública e política se promiscua e se degenere quando o parlamentar se deixa corromper, tanta na sua forma de atuação, quanto nas suas práticas repudiáveis.
A promiscuidade aludida é consentida porque a sociedade ignora que o governo, ao arremessar o laço no pescoço da rês, desequilibra as forças entre os dois poderes (legislativo e executivo), tornando-se igualmente cúmplice e operador de uma prática permissiva e, por cima, ainda premia de forma explicita o oportunista que sai do seu curral eleitoral para se tornar latifundiário de uma secretaria subalterna.
Atento às essas artimanhas desprezíveis, caberia perguntar ao eleitor: para que serve mesmo um deputado estadual subalterno no Ceará¿
Eu respondo com toda tranqüilidade: para nada! e o mesmo vale também, por lógico, para a Câmara de Vereadores de Fortaleza.
Ruy Câmara
Escritor e sociólogo