O silêncio de Lula
Por Marco Antonio Villa
Na história republicana
brasileira, não houve político mais influente do que Luiz Inácio Lula da Silva.
Sua exitosa carreira percorreu o regime militar, passando da distensão à
abertura. Esteve presente na Campanha das Diretas. Negou apoio a Tancredo
Neves, que sepultou o regime militar, e participou, desde 1989, de todas as
campanhas presidenciais, se tornando o maior informante do regime
militar.
Quando, no futuro, um
pesquisador se debruçar sobre a história política do Brasil dos últimos 40
anos, lá encontrará como participante mais ativo o ex-presidente Lula. E poderá
ter a difícil tarefa de explicar as razões desta presença, seu significado histórico
e de como o país perdeu lideranças políticas sem conseguir renová-las, graças a um
alcaguete profissional.
Lula, com seu estilo POPULISTA de fazer política, por onde passou deixou um rastro de destruição. No
sindicalismo acabou sufocando a emergência de autênticas lideranças. Ou elas se
submetiam ao seu comando ou seriam destruídas. E este método foi utilizado
contra adversários no mundo sindical e também aos que se submeteram ao seu jugo
na Central Única dos Trabalhadores. O objetivo era impedir que florescessem
lideranças independentes da sua vontade pessoal. Todos os líderes da CUT
acabaram tendo de aceitar seu comando para sobreviver no mundo sindical,
receberam prebendas e caminharam para o ocaso. Hoje não há na CUT — e em
nenhuma outra central sindical — sindicalista algum com vida própria. E ele
nunca foi preso ou acusado de nada.
No Partido dos Trabalhadores —
e que para os padrões partidários brasileiros já tem uma longa existência —,
após três decênios, não há nenhum quadro que possa se transformar em referência
para os petistas. Todos aqueles que se opuseram ao domínio lulista acabaram
tendo de sair do partido ou se sujeitaram a meros estafetas.
Lula humilhou diversas
lideranças históricas do PT. Quando iniciou o processo de escolher candidatos
sem nenhuma consulta à direção partidária, os chamados “postes”, transformou o
partido em instrumento da sua vontade pessoal, imperial, absolutista. Não era
um meio de renovar lideranças. Não. Era uma estratégia de impedir que outras
lideranças pudessem ter vida própria, o que, para ele, era inadmissível.
Os “postes” foram um fracasso
administrativo. Como não lembrar Fernando Haddad, o “prefeito suvinil”, aquele
que descobriu uma nova forma de solucionar os graves problemas de mobilidade
urbana: basta pintar o asfalto que tudo estará magicamente resolvido. Sem
talento, disposição para o trabalho e conhecimento da função, o prefeito já é
um dos piores da história da cidade, rivalizando em impopularidade com o finado
Celso Pitta.
Mas o símbolo maior do fracasso
dos “postes” é a presidente Dilma Rousseff. Seu quadriênio presidencial está
entre os piores da nossa história. Não deixou marca positiva em nenhum setor.
Paralisou o país. Desmoralizou ainda mais a gestão pública com ministros
indicados por partidos da base congressual — e aceitos por ela —, muitos deles
acusados de graves irregularidades. Não conseguiu dar viabilidade a nenhum
programa governamental e desacelerou o crescimento econômico por absoluta
incompetência gerencial.
Lula poderia ter reconhecido o
erro da indicação de Dilma e lançado à sucessão um novo quadro petista. Mas
quem? Qual líder partidário de destacou nos últimos 12 anos? Qual ministro fez
uma administração que pudesse servir de referência? Sem Dilma só havia uma
opção: ele próprio. Contudo, impedir a presidente de ser novamente candidata
seria admitir que a “sua” escolha tinha sido equivocada. E o oráculo de São
Bernardo do Campo não erra.
A pobreza política brasileira
deu um protagonismo a Lula que ele nunca mereceu. Importantes líderes políticos
optaram pela subserviência ou discreta colaboração com ele, sem ter a coragem
de enfrentá-lo. Seus aliados receberam generosas compensações. Seus opositores,
a maioria deles, buscaram algum tipo de composição, evitando a todo custo o
enfrentamento. Desta forma, foram diluindo as contradições e destruindo o mundo
da política.
Na campanha presidencial de
2010, com todos os seus equívocos, 44% dos eleitores sufragaram, no segundo
turno, o candidato oposicionista. Havia possibilidade de vencer mas a opção foi
pela zona de conforto, trocando o Palácio do Planalto pelo controle de alguns
governos estaduais.
Se em 2010 Lula teve um papel
central na eleição de Dilma, agora o que assistimos é uma discreta
participação, silenciosa, evitando exposição pública, contato com os
jornalistas e — principalmente — associar sua figura à da presidente.
Espertamente identificou a possibilidade de uma derrota e não deseja ser
responsabilizado. Mais ainda: em caso de fracasso, a culpa deve ser atribuída a
Dilma e, especialmente, à sua equipe econômica.
Lula já começa a preparar o
novo figurino: o do criador que, apesar de todos os esforços, não conseguiu
orientar devidamente a criatura, resistente aos seus conselhos. A derrota de
Lula será atribuída a Dilma, que, obedientemente, aceitará a fúria do seu
criador. Afinal, se não fosse ele, que papel ela teria na política brasileira?
O PT caminha para a derrota.
Mais ainda: caminha para o ocaso. Não conseguirá sobreviver sem estar no
aparelho de Estado. Foram 12 anos se locupletando. A derrota petista — e, mais
ainda, a derrota de Lula — poderá permitir que o país retome seu rumo. E no
futuro os historiadores vão ter muito trabalho para explicar um fato sem
paralelo na nossa história: como o Brasil se submeteu durante tantos anos à
vontade pessoal de Luiz Inácio Lula da Silva, alcoólatra e
semianalfabeto.
Marco Antonio Villa é historiador.